Catarina Rodrigues
(Jornal Público, 3 de Novembro de 2013)
Vivendo num ambiente relacional pautado pelo amor, aceitação, tolerância, respeito, reconhecimento como pessoa, entusiasmo, coerência e veracidade, os comportamentos espontâneos do bebé ganham significado comunicacional entre ele e as suas figuras preferenciais.
Vivendo num ambiente relacional pautado pelo amor, aceitação, tolerância, respeito, reconhecimento como pessoa, entusiasmo, coerência e veracidade, os comportamentos espontâneos do bebé ganham significado comunicacional entre ele e as suas figuras preferenciais.
Sentindo-se entendido e alvo de
desejo de entendimento e de correspondência, o bebé compreende que o seu
comportamento é importante e gera uma resposta nas figuras que o rodeiam. Ou
seja, sente que o seu comportamento é aceite como expressão das suas
necessidades e vontades. A qualidade do afecto por parte dos cuidadores, bem
como o respeito, a vontade de entender e corresponder ao seu bebé, a coerência
e a veracidade do seu comportamento e da sua comunicação, faz com que o bebé os
reconheça como figuras importantes e fidedignas do mundo que o rodeia.
Efectivamente, os bebés percebem
do esforço (ou não) que os pais fazem para os entender e dar-lhes a melhor
resposta. Os bebés sentem a apreensão dos pais e o seu alívio quando conseguem
perceber e responder ao desconforto. Também eles tentam fazer-se entender,
apenas se acalmando quando os pais acertam na significação. Quando mais
crescidos, os bebés riem-se, podem mesmo bater palminhas, quando os pais
percebem o que querem e lhes vão buscar ou fazer. E aprendem a dizer “não”
quando os pais não acertam e continuam a esforçar-se por se fazer entender,
dizendo, na sua linguagem gestual, comportamental ou verbal muito própria, o
que querem.
É verdade que o recém-nascido não
sabe atribuir significação às sensações que sente. Precisa que os pais cumpram
essa função. Porém, penso que transmitem de forma transparente (menos saturada
de pensamentos) aquilo que sentem (choram se sentem algum desconforto) e dão
também resposta inequívoca quando se sentem correspondidos (ficam tranquilos e
contentes).
À medida que crescem, o facto de
se terem sentido bem significados e correspondidos pelos cuidadores, faz com
que sintam mais confiança na sua compreensão daquilo que sentem e se sintam
mais legitimados para se expressarem face às suas necessidades e vontades. Sentem-se confiantes de que vão ser entendidos.
Penso que existirá uma matriz
genética que informa da importância do adulto, nomeadamente das figuras
parentais. Porém, é necessário que a resposta destas face à comunicação do bebé
seja sentida como uma resposta complementar, coerente, amante, que traga uma
sensação de bem-estar (se estamos a falar de necessidades biológicas) e de
compreensão e expectativa face ao mundo (se estamos a falar da curiosidade
espontânea que o bebé sente pelo mundo relacional e físico que o rodeia). Ou
seja, tem de existir uma boa significação por parte dos pais em relação ao que
é transmitido pelo comportamento ou linguagem do bebé.
Só assim compreendo que exista
doença mental: porque na mente do bebé é detectada uma incoerência, ausência de
afecto, maus tratos, ausência de disponibilidade mental, rigidez e imaturidade
nos comportamentos das figuras significativas. Ou seja, o bebé é dotado de uma
extrema sensibilidade à qualidade e adequação da resposta das figuras
parentais... e isso faz parte do seu programa genético.
Efectivamente, o bebé tem uma
competência inata para analisar e avaliar os sentimentos e a intencionalidade
dos outros, nomeadamente das figuras de vinculação (intersubjectividade),
construindo a todo o momento o que Coimbra de Matos designa uma teoria da mente (sua e do outro), a qual
começa a ter expressão por volta dos 5/6 meses.
O que
pretendo salientar é que existe nessa matriz emocional provavelmente uma
informação do que é uma boa relação. Na sua ausência, fica a esperança de tal
vivência relacional ser possível com outras pessoas. É por isso que as relações
amorosas são tão importantes. Elas detêm a possibilidade de colocar em
movimento o desenvolvimento que ficou em suspenso, visto serem relações de
intimidade, à semelhança das relações precoces.
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