Jornal Público (28 de Abril de 2013)
Catarina Rodrigues
Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta
É bem cedo no
desenvolvimento infantil que nos apercebemos da importância do olhar e das
verbalizações de orgulho por parte das figuras parentais em relação às conquistas
que os filhos vão fazendo e da influência que têm na perseverança e na
confiança da pessoa ao longo da vida.
Em minha opinião, tal
importância é reconhecida pelo bebé tão cedo quanto os 4/5 meses.
Efectivamente, crescendo no seio de uma relação de amor, é por volta dessa
idade que podemos observar que o bebé faz coisas com intenção de despoletar reacções
de orgulho e de espanto nos pais. Por exemplo, pegou num livrinho que os pais
lhe costumam ler, ri e olha para os pais à espera da resposta. Com mais idade, olha
para os pais enquanto faz alguma coisa e bate palminhas e ri – exemplificando a
reacção que “espera” da parte dos pais. Comportamento que demonstra bem como, precocemente,
somos capazes de “pedir” aquilo de que precisamos para crescer: o deslumbre, o
orgulho e o prazer do outro significativo… Para o perceber, basta estar atento
e disponível emocionalmente.
A luz que é projectada
do olhar de orgulho parental é captada e interiorizada pelos filhos sob a forma
de reconhecimento da sua competência, de deslumbre face à capacidade
demonstrada. Em suma, de orgulho face ao filho que se tem.
Quando somos bebés, o
olhar é um veículo por excelência da comunicação intersubjectiva entre nós e o
outro. Há outros sinais comunicantes, como as hormonas, e que captamos a um
nível não-consciente e que nos dão informação mais precisa sobre a sintonia
entre aquilo que vemos e que sentimos por parte do outro. E que antes de
falarmos e de compreendermos bem a linguagem verbal se tornam informação
preciosa sobre como somos vistos, sentidos e compreendidos pelo outro
significativo.
Os bebés são extremamente sensíveis às
emoções dos pais e conseguem discriminar a genuinidade das suas expressões.
Como seres não falantes, os bebés são peritos na captação da informação não-verbal
e essa informação fica guardada na memória de uma forma não-consciente, como proto-sentimentos ou precursores de
sentimentos.
Percebemos bem essa
importância quando estamos diante de pessoas que se não se sentiram o alvo do
orgulho dos pais e de como isso funcionou como um agente depressígeno em toda a
sua vida. A falta do orgulho parental deixou uma pedra no sapato que impediu a
pessoa de andar bem, correr e até de saltar os obstáculos da vida.
Na ausência da luz do
orgulho parental (que dá calor e energia), fica a sombra fria da depressão, que
bloqueia o ânimo e a confiança.
Sou como fui visto/amado
Para compreendermos bem
porque é que o papel dos pais é tão importante no desenvolvimento, temos de
pensar sobre o seu papel na construção da nossa identidade.
Embora tenha uma base biológica, a identidade é uma construção relacional.
Precocemente (até aos 18 meses de idade), bebé identifica-se pela
incorporação-assimilação da imagem com que o outro o define. Ou seja, “sou como
fui conhecido”. Vou construindo a minha ideia de mim através da assimilação que
faço da imagem que os meus pais me devolvem de mim próprio. Coimbra de Matos
designa-a por identificação imagóico-imagética.
Por isso, quando falo em orgulho parental não estou a falar de orgulho narcíseo (em que os pais se orgulham de forma narcísica do elevado desempenho dos seus
filhos), mas sobretudo da espontaneidade do prazer de conhecer e de ver o nosso
filho descobrir e actuar no mundo. Isso, por si só, é deslumbrante!
Tal olhar parental fá-lo
sentir-se único, especial e capaz de conquistar o mundo. E isso é tudo o que é
preciso para se desenvolver. Os limites e as frustrações, as insuficiências e
as decepções serão ensinamentos da vida, que poderão ser melhor geridos – isto
é, sem afectar a auto-estima – quanto mais a pessoa se sentiu apreciada e
valorizada. Um valor que fará parte da sua reserva interna: «Sei do meu valor
como pessoa porque fui e senti-me valorizado/amado».
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