26/09/2013

Orgulho Parental - o ingrediente secreto

Jornal Público (28 de Abril de 2013)


Catarina Rodrigues
Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta

É bem cedo no desenvolvimento infantil que nos apercebemos da importância do olhar e das verbalizações de orgulho por parte das figuras parentais em relação às conquistas que os filhos vão fazendo e da influência que têm na perseverança e na confiança da pessoa ao longo da vida.

Em minha opinião, tal importância é reconhecida pelo bebé tão cedo quanto os 4/5 meses. Efectivamente, crescendo no seio de uma relação de amor, é por volta dessa idade que podemos observar que o bebé faz coisas com intenção de despoletar reacções de orgulho e de espanto nos pais. Por exemplo, pegou num livrinho que os pais lhe costumam ler, ri e olha para os pais à espera da resposta. Com mais idade, olha para os pais enquanto faz alguma coisa e bate palminhas e ri – exemplificando a reacção que “espera” da parte dos pais. Comportamento que demonstra bem como, precocemente, somos capazes de “pedir” aquilo de que precisamos para crescer: o deslumbre, o orgulho e o prazer do outro significativo… Para o perceber, basta estar atento e disponível emocionalmente.

A luz que é projectada do olhar de orgulho parental é captada e interiorizada pelos filhos sob a forma de reconhecimento da sua competência, de deslumbre face à capacidade demonstrada. Em suma, de orgulho face ao filho que se tem.

Quando somos bebés, o olhar é um veículo por excelência da comunicação intersubjectiva entre nós e o outro. Há outros sinais comunicantes, como as hormonas, e que captamos a um nível não-consciente e que nos dão informação mais precisa sobre a sintonia entre aquilo que vemos e que sentimos por parte do outro. E que antes de falarmos e de compreendermos bem a linguagem verbal se tornam informação preciosa sobre como somos vistos, sentidos e compreendidos pelo outro significativo.

Os bebés são extremamente sensíveis às emoções dos pais e conseguem discriminar a genuinidade das suas expressões. Como seres não falantes, os bebés são peritos na captação da informação não-verbal e essa informação fica guardada na memória de uma forma não-consciente, como proto-sentimentos ou precursores de sentimentos.

Percebemos bem essa importância quando estamos diante de pessoas que se não se sentiram o alvo do orgulho dos pais e de como isso funcionou como um agente depressígeno em toda a sua vida. A falta do orgulho parental deixou uma pedra no sapato que impediu a pessoa de andar bem, correr e até de saltar os obstáculos da vida.

Na ausência da luz do orgulho parental (que dá calor e energia), fica a sombra fria da depressão, que bloqueia o ânimo e a confiança.

Sou como fui visto/amado

Para compreendermos bem porque é que o papel dos pais é tão importante no desenvolvimento, temos de pensar sobre o seu papel na construção da nossa identidade.

Embora tenha uma base biológica, a identidade é uma construção relacional. Precocemente (até aos 18 meses de idade), bebé identifica-se pela incorporação-assimilação da imagem com que o outro o define. Ou seja, “sou como fui conhecido”. Vou construindo a minha ideia de mim através da assimilação que faço da imagem que os meus pais me devolvem de mim próprio. Coimbra de Matos designa-a por identificação imagóico-imagética.

Por isso, quando falo em orgulho parental não estou a falar de orgulho narcíseo (em que os pais se orgulham de forma narcísica do elevado desempenho dos seus filhos), mas sobretudo da espontaneidade do prazer de conhecer e de ver o nosso filho descobrir e actuar no mundo. Isso, por si só, é deslumbrante!

Tal olhar parental fá-lo sentir-se único, especial e capaz de conquistar o mundo. E isso é tudo o que é preciso para se desenvolver. Os limites e as frustrações, as insuficiências e as decepções serão ensinamentos da vida, que poderão ser melhor geridos – isto é, sem afectar a auto-estima – quanto mais a pessoa se sentiu apreciada e valorizada. Um valor que fará parte da sua reserva interna: «Sei do meu valor como pessoa porque fui e senti-me valorizado/amado».

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